O envelhecimento é um processo inexorável e está associado ao declínio da função dos diversos sistemas do corpo humano. Quão comum é encontrar um indivíduo repleto de tempo, disposição e vontade para participar de atividades de trabalho e lazer, porém com limitações impostas por problemas no seu aparelho locomotor?
Um dos principais vilões do envelhecimento musculoesquelético é a osteoartrite, também conhecida como osteoartrose, artrose ou, até mesmo, pelo jargão “reumatismo”. Trata-se de doença articular degenerativa, caracterizada principalmente pelo desgaste da cartilagem, do osso adjacente e das demais estruturas que compõem a articulação. Os principais fatores de risco são idade avançada, sexo feminino, obesidade, deformidades congênitas ou adquiridas, traumatismos e fraturas prévias, sedentarismo e predisposição genética.
A osteoartrose é uma doença extremamente comum e traz consigo grande impacto por estar associada a incapacidade física. Acomete cerca de um quinto da população mundial, em especial após a quinta década de vida, e é responsável por uma grande parcela dos atendimentos médicos, dos gastos em saúde e das faltas ao trabalho.
As principais manifestações são dor, enrijecimento e deformidades articulares, que geralmente se instalam lenta e progressivamente. Joelhos, quadris, ombros, mãos e pés (dedos) são os locais mais comumente afetados.
O tratamento deve ser individualizado. As opções dependem da articulação acometida e de idade, autonomia, estado de saúde e expectativas do paciente. Os objetivos incluem melhora ou cura dos sintomas, recuperação da funcionalidade, retorno às atividades habituais e correção de deformidades adquiridas. As principais modalidades disponíveis são exercício físico orientado, medidas comportamentais (como perda de peso e uso de órteses e palmilhas), cirurgias (como as que envolvem a substituição da articulação por uma prótese) e medicamentos (orais, tópicos e injetáveis).
Quanto ao uso de medicamentos, até o presente momento, quando consideramos apenas os estudos científicos conduzidos com metodologia adequada e capazes de gerar evidência sólida, nenhum se mostrou eficaz para prevenir a evolução da osteoartrite. Apesar disso, muitos produtos são comercializados com a promessa de modificar a história natural da doença, o que gera confusão e falsas expectativas no público em geral.
A Glicosamina e a Condroitina, moléculas naturalmente presentes no nosso organismo e precursoras de constituintes do tecido articular, são comercializadas como medicamento “condroprotetores” para o tratamento da osteoartrite. No entanto, quando ingeridas por via oral, apresentam baixa absorção no intestino, com mecanismo de ação bastante incerto. Em termos de resultados, alguns estudos demonstram pequena melhora nos níveis de dor, principalmente nos joelhos. No que se refere ao desgaste da articulação, não há consenso médico quanto a eficácia na sua redução, mas, ao menos, sabe-se que o tratamento é seguro e com baixo risco de efeitos adversos. Existem ainda outras medicações amplamente utilizadas com a finalidade “condroprotetora”, porém com ainda menos evidência de benefício.
De modo geral, o uso de medicamentos “condroprotetores” não faz parte do tratamento inicial da osteoartrite, já que existem diversas alternativas comprovadamente mais eficazes, como exercícios, perda de peso, analgésicos e anti-inflamatórios. Deve-se sempre levar em conta que a eficácia deste tratamento deve ser monitorizada por um período mínimo de 3 a 6 meses, sendo que a ausência de melhora da dor indica a suspensão da medicação “condroprotetora”.
Em resumo, a osteoartrite é uma doença frequente, que demanda um tratamento multimodal e que, de modo geral, não tem como pilar o uso de medicamentos. Dessa forma, é preciso alinhar as expectativas do paciente à realidade da sua doença e das opções atuais de tratamento.
Dr. Ricardo Krieger Azzolini
Referências
1. Ministério da Saúde – http://www.brasil.gov.br/saude/2012/04/osteoartrose.
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4. Sawitzke A.D., et al., Clinical efficacy and safety of glucosamine, chondroitin sulphate, their combination, celecoxib or placebo taken to treat osteoarthritis of the knee: 2-year results from GAIT. Annals of the Rheumatic Diseases, 2010. 69(8): p1459.
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6. Singh J.A., et al., Chondroitin for osteoarthritis. The Cochrane Database of Systematic Reviews, 2015. 1:CD005614.
Dr. Ricardo Krieger Azzolini é médico formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, com residência médica em Clínica Médica e Reumatologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC-FMUSP). É membro da Sociedade Brasileira de Reumatologia e coordenador médico da Reumatologia no Setor de Convênios e Particulares do HC-FMUSP. Atende em consultório particular na Bela Vista. Contato: 011 3159-1118.