O cigarro eletrônico é um dispositivo que se parece com um cigarro tradicional, mas não contém tabaco. Ele usualmente contém nicotina. O dispositivo depende de uma bateria e vaporiza um líquido que é inalado pelo usuário. Em geral, há uma luz na ponta que acende durante o uso, simulando um cigarro de verdade. Enquanto usuários e fabricantes afirmam que ele reduz os danos à saúde em relação ao uso do tabaco, sociedades médicas têm sistematicamente se posicionado contra o uso e a venda.
Mas se não há tabaco, o que tem no cigarro eletrônico? O líquido que é aquecido quase sempre contem propilenoglicol, glicerol e flavorizantes, como o mentol, além da nicotina. No entanto, há inúmeros fabricantes e nenhuma regulamentação quanto às formulações. Algumas análises realizadas pelo FDA, a agência federal de regulação dos Estados Unidos, demonstraram presença frequente de substâncias irritantes e até mesmo cancerígenas na composição. Além disso, estas análises demonstraram que o controle de qualidade é fraco, com grandes variações entre lotes de um mesmo fabricante.
Muitos estudos vêm sendo conduzidos para tentar entender melhor os efeitos do cigarro eletrônico. Estes dispositivos entraram no mercado mundial em 2006, de forma que ainda não houve tempo hábil para demonstrar seus efeitos de longo-prazo. Todavia, um estudo em animais publicado em 2016 demonstrou que a exposição ao cigarro eletrônico foi capaz de lesar o tecido dos pulmões e causar enfisema pulmonar da mesma forma que o cigarro tradicional. Além disso, estudos preliminares apresentados no último congresso da European Respiratory Society, a sociedade europeia de Pneumologia, realizado em setembro de 2017, demonstraram que o uso do cigarro eletrônico foi associado a um enrijecimento das artérias em voluntários saudáveis, o que pode estar associado a longo-prazo com consequências como hipertensão, infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral. Estes estudos demonstraram também que a exposição ao vapor do cigarro eletrônico foi associada a sintomas respiratórios como chiado e tosse imediatamente após o uso do dispositivo.
A Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, a sociedade americana e também a sociedade europeia se posicionam contra a liberação da produção e da venda do cigarro eletrônico. Entretanto, seu apelo é forte. Entre tabagistas, é visto como uma forma de redução de danos. Entre os jovens, vem se tornando a porta de entrada para o vício da nicotina, já superando o cigarro tradicional em países onde sua venda é liberada. A infinidade de sabores e a permissão de uso em alguns ambientes fechados favorece ainda mais a sua disseminação.
Uma dúvida importante é se quem já fuma se beneficiaria da troca do cigarro tradicional pelo eletrônico. Acredita-se que sim, pela eliminação do processo de queima, porém ainda não há nenhuma comprovação neste sentido. Outra dúvida é sobre o uso do cigarro eletrônico como estratégia para parar de fumar. Uma revisão publicada em 2014 demonstrou que fumantes que passaram a usar cigarro eletrônico reduziram o uso de tabaco, porém não necessariamente reduziram a exposição a nicotina.
Hoje o Brasil segue a tendência de outros países: o cigarro eletrônico ainda não é liberado pela Anvisa. Para quem quer parar de fumar, há diversas estratégias medicamentosas e comportamentais. Interromper o hábito tabágico é fundamental para a manutenção da saúde e da qualidade de vida. O que se sabe é que o processo nunca é fácil, mas as taxas de sucesso são significativamente maiores entre aqueles que tentam parar com acompanhamento profissional e com terapias seguras e cientificamente comprovadas.
Dra. Bruna Mamprim Piloto
Referências
- Folan, P., & Jacobsen, D, American Thoracic Society series on tobacco: The Electronic Cigarette. Tobacco Control Committee of the American Thoracic Society.
- Hartmann-Boyce, J., et al., Electronic cigarettes for smoking cessation. Cochrane Tobacco Addiction Group.
- Taraseviciene-Stewart, L., et al., The Damaging Effects of Electronic Cigarettes on Lung Structure. American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine, 2017.
- Position statement on e-cigarettes by American Thoracic Society. American Thoracic Society (ATS).